O fim da isenção de tributos para os livros abalou o setor editorial nos últimos dias. Desde 2004, a Lei nº 10.865 desonera o livro de contribuições como o PIS e a CONFINS – no entanto, a imunização aos impostos está garantida na lei há quase oitenta anos. A Constituição Federal de 1946, por meio de uma Emenda Constitucional apresentada por Jorge Amado – naquele momento, deputado federal e já consagrado escritor – estabeleceu ser vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre o papel destinado à impressão de jornais, periódicos e livros.
Mantida na Carta de 1988, as leis pareciam impedir a tributação da indústria literária. Contudo, recentemente, o governo utilizou-se uma manobra para mudar essa situação. A primeira parte da reforma tributária, apresentada por Paulo Guedes ao Congresso em 21 de julho, unifica o PIS e a Confins e cria a CBS (Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços), com alíquota de 12%.
A crise: panorama geral
O novo imposto atinge um setor financeiramente debilitado. Em déficit, o mercado editorial encolheu 20% desde 2006. A Saraiva e a Cultura, maiores redes de livrarias do país – na tentativa de evitarem a falência – entraram com pedido de recuperação judicial em 2018, fechando dezenas de lojas físicas. A pandemia do novo coronavírus afetou ainda mais as empresas, levando-as a sofrer mais prejuízo, dependendo exclusivamente das vendas on-line. Apesar da melhora no último mês, a queda no faturamento atingiu 47,6% em abril. O valor caiu de R$ 125,4 milhões para R$65,7 milhões.
O acúmulo de dívidas das livrarias ameaça as editoras, sobretudo, médias e pequenas. Isso acontece porque, diferentemente de outros setores, o mercado editorial funciona sob o sistema de consignação. Nessa dinâmica, em vez comprar os exemplares para revendê-los, as livrarias recebem lotes de livros – enviados pelas próprias editoras – sendo estabelecido uma comissão sobre o preço de capa. Assim, é estipulado um prazo – em geral, 30 ou 60 dias – e após esse período, as livrarias realizam o pagamento e devolvem às editoras aqueles que não foram vendidos, sem nenhum custo. No entanto, as dívidas milionárias vêm impedindo as livrarias de honrarem os acordos e as editoras não recebem o valor por livros que já foram comercializados. Em efeito dominó, a baixa arrecadação desacelera a produção e diminui a frequência de lançamentos, retroalimentando a crise.
Acesso à cultura
A Câmara Brasileira de Livros (CBL), o Sindicato Nacional dos Editores de Livro (Snel), a Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares (Abrelivros) e outras entidades publicaram – em parceria – o “Manifesto em Defesa do Livro”, que propõe cinco ponderações sobre a reforma tributária. Além do impacto negativo sobre livrarias, distribuidoras, editoras e autores, outra preocupação das associações são as consequências da alíquota no preço do livro. Em 2019, o preço médio de um livro foi R$19, segundo dados da Nielsen, do Snel e da CBL. Desde a redução a zero da alíquota do PIS e da CONFINS, o produto foi tornando-se cada vez mais acessível à população.
“Isso permitiu uma redução imediata do preço dos livros nos anos seguintes: entre 2006 e 2011, o valor médio diminuiu 33% com um crescimento de 90 milhões de exemplares vendidos. Os fatos demonstram claramente a correlação entre crescimento econômico, melhoria da escolaridade e aumento da acessibilidade do livro no país.”
Para defender a adoção da alíquota, Paulo Guedes – ministro da Economia – argumentou que o livro é produto de elite e sugeriu a adoção direta de livros. O posicionamento foi amplamente criticado por especialistas do mercado editorial, que defendem que a contribuição restringe ainda mais o acesso da população à cultura.
“As instituições ligadas ao livro estão plenamente conscientes da necessidade da reforma e simplificação tributárias no Brasil. Mas não será com a elevação do preço dos livros – inevitável diante da tributação inexistente até hoje – que se resolverá a questão. Menos livros em circulação significa mais elitismo no conhecimento e mais desigualdade de oportunidades no país das desigualdades conhecidas, mas pouco combatidas.”
A campanha em defesa do livro (#defendaolivro) está mobilizando milhões de pessoas nas redes sociais. Para saber mais, leia e divulgue o Manifesto em Defesa do Livro: http://cbl.org.br/imprensa/noticias/manifesto-em-defesa-do-livro. Assine a petição: https://www.change.org/p/congresso-defendaolivro-diga-n%C3%A3o-a-tributa%C3%A7%C3%A3o-de-livros?redirect=false
Fontes: Agência Brasil, Noticias.r7, G1, SNEL