No Brasil, o movimento vegano está ganhando cada vez mais destaque. Segundo pesquisa do IBOPE Inteligência conduzida em abril de 2018, 14% da população brasileira é vegetariana. Isso representa um crescimento de 75% em relação ao ano de 2012, atingindo o número recorde de 30 milhões de brasileiros adeptos à dieta.
Veganismo e vegetarianismo
A diferença entre o veganismo e vegetarianismo é sutil: enquanto vegetarianos estritos não consomem nenhum tipo de carne e outros derivados, como ovo, leite e queijo, os veganos vão além da alimentação, utilizando somente produtos que não contenham ingredientes de origem animal na composição. As nuances que diferenciam os movimentos são diversas, no entanto, a razão que os une é uma só: o meio ambiente.
Experiência pessoal: inspiração e adaptação
Fabiana Pinheiro, estudante de História da Arte na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), detalhou a sua experiência pessoal com o veganismo. Adepta ao movimento há quase três anos, ela explicou que a aproximação foi natural; desde a infância planejava adotar uma alimentação sem crueldade animal, mas, até aquele momento, sentia-se incapaz de seguir adiante. “Aos quinze anos, me deu um estalo.” O momento de inspiração aconteceu no Shopping Botafogo, na Zona Sul. À passeio, encontrou-se com ativistas pelos direitos dos animais, que panfletavam no local, e lendo o conteúdo, foi sensibilizada pela questão.
O processo de transição foi rápido: em apenas dois meses abandonou o consumo de todos os tipos de carnes e derivados. Alimentando-se com variedade de legumes e verduras, a refeição não deixou de ser saudável e, até mesmo, saborosa. Para Fabiana, o paladar adapta-se à nossa dieta, podendo ser adequado ao novo hábito. Além disso, ela explicou que em sua primeira consulta à nutricionista após tornar-se vegana, a profissional receitou o consumo diário de uma cápsula de B12. Essa vitamina, que faz parte do complexo B, é de origem bacteriana, tornando-se biodisponível para os seres humanos através de produtos de origem animal ou de suplementação, como no exemplo dos vegetarianos estritos e veganos. Na adaptação de cosméticos e outros produtos de higiene pessoal, a mudança foi simples. Alertando para os rótulos, selos veganos e cruelty free (livre de crueldade animal), a estudante afirma que o valor cobrado é acessível.
É para todos?
Em debates nas redes sociais, principalmente no Twitter, é amplamente discutido a imagem que o veganismo assume para a população. Enquanto alguns influenciadores digitais insistem em embranquecer e elitizar o movimento, ativistas, como Nátaly Neri e SapaVegana, difundem um modelo possível para todos. “O veganismo não é sobre comprar uma peça de tofu por vinte reais, é sobre arroz e feijão”, concluiu.
Mais do que trocar antigos hábitos, tornar-se vegano é uma mudança de filosofia. Inspirada pela questão do sofrimento animal, hoje, a estudante ampliou os horizontes sobre o impacto do movimento no planeta. “No nosso mundo capitalista, o meio ambiente é tão massacrado e a indústria da carne tem um papel muito importante na destruição”, afirmou. Segundo ela, a humanidade, de maneira geral, sente dificuldades de enxergar-se como parte da natureza, avançando sem freios em um processo de autodestruição. Nesse contexto, o veganismo assume o papel de ser uma alternativa ao estilo de vida agressivo adotado pela sociedade. “É a forma que eu penso, que eu consigo, dentro da minha realidade, evitar, nem que seja um pouquinho, que isso aconteça”, explicou.
Impacto ambiental
Graduada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e professora aposentada de biologia no Colégio Pedro II, Eliane Trigo, explicou mais sobre o impacto do consumo de carne, sobretudo a vermelha, no planeta. “Grande parte do Cerrado já não existe mais porque, no lugar dele, existe a criação de gado”, afirmou. A destruição do bioma, que é exclusivamente brasileiro, é uma perda irreparável de biodiversidade, causando a extinção de diversas espécies.
Segundo ela, o problema pode ir além: os produtores agropecuários estão avançando para a Região Norte, afetando o clima do país. A Floresta Amazônica, por meio de intensa de evapotranspiração, é responsável pela formação dos rios voadores: massas de ar carregadas de vapor d’água que viajam para o Centro-Oeste, Sudeste e Sul, caindo sob a forma líquida em todo território. O desmatamento reduz a quantidade desses rios, fundamentais para manutenção do regime de chuvas no país. Além disso, os animais bovinos são os principais emissores de gás metano na atmosfera terrestre, destruindo a camada de ozônio que protege a Terra contra os raios ultravioletas. “A vida só pode existir no planeta, atualmente, por causa da camada de ozônio”, explicou.
Questão de consciência
Eliane Trigo, apesar de não ser vegana ou vegetariana, é adepta de um estilo de vida mais consciente. Ela não consome carne vermelha desde os vinte e um anos, reduzindo o consumo semanal de produtos de origem animal. Apesar da carne ser a fonte principal de proteína, ela pode ser substituída por outros alimentos, sobretudo, leguminosas, como o feijão, soja e o grão-de-bico. O consumo de leite de vaca, muito comum no país, também pode ser revisto. “A partir dos 8 anos, a maioria das pessoas vai perdendo a capacidade de digerir o leite”. O cálcio, obtido por meio da bebida, pode ser encontrado em vegetais, como folhas escuras e brócolis.
Para a professora, é possível ter uma alimentação balanceada somente com produtos de origem vegetal. Além da B12, ela recomendou a suplementação de triptofano, aminoácido encontrado principalmente na carne, que compõe a serotonina, popularmente conhecida como hormônio da felicidade. Segundo ela, é essencial, antes de tornar-se vegano, consultar um nutricionista e aprender mais sobre os nutrientes de cada alimento, para saber montar uma refeição saudável e completa.