No início deste mês, numa sexta-feira (12), Gabriel Silva Santos, 22 anos, foi preso em frente a uma agência bancária no Centro Administrativo da Bahia (CAB, pelo roubo de um carro e tentativa de extorsão. O marido da vítima, Marcos, foi quem identificou o jovem como um dos suspeitos do crime. Ele tinha ido até o local e, ao ver Gabriel, que tinha as mesmas características físicas que o ladrão (negro, cabelo loiro e tatuado), ligou para a polícia.

O jovem foi abordado por dois policiais à paisana e levado à delegacia. Inicialmente, de acordo com Gabriel, ele confundiu a abordagem policial com um assalto e entregou o celular. Em entrevista à TV Globo, ele afirmou que foi agredido pelos agentes e ainda revelou que a arma de fogo foi usada para realizar um disparo perto do seu ouvido. O marido da vítima afirmou que a mulher reconheceu Gabriel como o autor do crime e que ela apenas distinguiu uma diferença na coloração do cabelo.

Inconsistências

Alberto Mariano Júnior, advogado de Gabriel, apontou inconsistências na descrição do assaltante, que mudou drasticamente. No dia do assalto, a mulher informou que o autor do crime era pardo, magro e com uma estatura aproximada de 1,70m. Gabriel é negro, com biotipo forte e tem mais de 1,80m. “Então, perceba que a característica, até pelo crime de roubo, não condiz com as informações”, concluiu ele em chamada de vídeo com o telejornal “Bahia Meio Dia”.

No ponto de vista do advogado, as circunstâncias do reconhecimento feito pela vítima do roubo também não foram adequadas. Segundo ele, não é razoável a ocorrência de um reconhecimento com apenas um suspeito, como aconteceu com Gabriel; seria necessária a presença de outras pessoas com características similares para garantir quem é o autor do crime.

De acordo com a versão da família, o jovem trabalhava como estoquista em uma loja de eletrodomésticos até dezembro do ano passado, quando foi demitido. Ainda na mesma sexta-feira ele foi à Caixa Econômica para realizar o saque da segunda parcela do seguro-desemprego, mas encontrou a agência fechada. Na saída, Gabriel foi abordado pelos policiais enquanto falava no telefone com o pai. Além do aparelho celular, ele também carregava a carteira de trabalho. Os familiares informaram que o jovem não sabe dirigir.

Liberdade

No dia seguinte, amigos e familiares de Gabriel protestaram em frente à Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos, em Salvador. No mesmo dia, Ashley Malia, repórter do jornal “A Tarde” e colaboradora da página “Pretitudes”, divulgou no seu perfil do Twitter a notícia da prisão com a hashtag #SoltemGabriel, que chegou a ficar em primeiro lugar na rede social. No domingo, após os advogados de Gabriel entrarem com um pedido de habeas corpus, Ivone Bessa, desembargadora, considerou não haver provas suficientes para a prisão do jovem, visto que, além do álibi ter sido confirmado, ele tem residência fixa e não apresenta antecedentes criminais.

Racismo

Na opinião de Ashley Malia, jornalista que viralizou a hashtag nas redes sociais, a prisão de Gabriel não é exceção, mas sim regra em um país onde a cor da pele vale mais do que provas. “Vivemos em uma cidade que é majoritariamente negra, mas somos vistos como suspeitos, como alvo. Nós não temos o direito de ser inocente até que se prove o contrário. O caso de Gabriel é mais uma prova do quanto estamos diante de um Estado racista”, afirmou em enttevista à Ponte.

A advogada Maria Eugênia Damasceno Pinto, que participou do caso e também é presidente do Connegro (Coletivo Nacional de Organização Negra), refletiu sobre a importância do engajamento popular e dos militantes antirracistas. “Se não fosse a velocidade do habeas corpus e a mobilização talvez hoje ele estaria no presídio e não em casa comendo uma feijoada com a família”.

Fontes: G1, El País, A Tarde/Uol

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